sábado, 4 de junho de 2022

ANNA PETROVNA BUNINA – A PRIMEIRA ESCRITORA PROFISSIONAL DA RÚSSIA

  



Анна Петровна Бунина


A primeira escritora russa a viver exclusivamente do trabalho literário



Anna Petrovna Bunina foi a primeira escritora russa a viver exclusivamente do trabalho literário, ou seja, a primeira escritora profissional da Rússia. Poetisa e tradutora, era apelidada por seus contemporâneos de Safo Russa, Décima Musa e Corina do Norte.

 

Para intelectuais e instrutores mundo afora, a Literatura russa sempre foi uma peça central de intenso estudo e debate. Porém, o nome de Anna Petrovna raramente é listado entre os grandes nomes literários russos, não porque ela não mereça um reconhecimento elevado. O fato de ela ser parente de Ivan Bunin, ganhador do Prêmio Nobel em 1933, não ajudou muito.

 

No entanto, ela merece ser celebrada com a mesma aclamação de seus pares mais destacados. Disciplinada, resiliente, inteligente, prática e talentosa, Bunina finalmente prevaleceu em seu trabalho literário contra todas as probabilidades.

 

Em uma época em que a sociedade tinha preferência pelos dramas apaixonados da ópera e do teatro, o escapismo prolongado dos romances ou as ousadias de escritores como Lord Byron, nome influente no Romantismo britânico, Bunina se destacou exercendo seu ofício por meio da poesia e da vida considerada produtiva e mansa. 

 

As circunstâncias em que ela nasceu moldaram a sua vida adulta. Sua mãe morreu durante o parto, deixando o bebê na aldeia de Urusovo, localizada em Ryazan, distrito rural a 200 km a sudeste de Moscou. Pouco habitada, a aldeia proporcionava espaço, solidão e beleza natural para o florescimento de uma mente imaginativa como a dela. 





 

Anna foi criada pela tia, mas morou também com outros parentes, pulando de casa em casa. Seu nível educacional em ler, escrever e as fazer as quatro operações aritméticas era, para a época, considerado mais que o suficiente para uma moça. Por ser menina, não podia de exercer nenhum tipo de profissão.

 

Os seus cuidadores não consideravam sua educação uma prioridade, embora houvesse exceções. Anna bordava muito bem e tecia rendas, mas se quisesse aprender idiomas estrangeiros, música ou canto, teria de mudar para as capitais.

 

Apesar disso, ela começou a escrever poesia aos treze anos. Sua primeira obra publicada foi o fragmento em prosa Liubov (Amor), na revista Ippokrena, 1799, n. 4.


Imersão nos estudos em São Petersburgo  

 

O pai de Anna Petrovna faleceu em 1802 e deixou como herança uma renda de 600 rublos. Não era muito, mas a libertava de morar nas casas dos outros e de ser tratada como “parente pobre”. No mesmo ano ela foi visitar o irmão, um oficial da marinha, em São Petersburgo, o grande centro cultural da Rússia. Com os recursos deixados pelo pai, ela resolveu morar na capital, em um apartamento na Ilha de Vassiliev.

 

Em São Petersburgo, ela estabeleceu a coisa mais próxima que uma mulher da época poderia ter de uma experiência universitária. Montou uma casa, contratou uma série de professores particulares e iniciou um regime rigoroso de estudos. Estudou física, matemática, francês, alemão, inglês e, principalmente, Literatura russa. Com isso, adquiriu um estilo de escrita muito mais sofisticado.








 

Dívidas e primeiros poemas

 

Em menos de dois anos o custo de vida de São Petersburgo, consumiu a herança de Bunina. Ela foi contraindo dívidas e não conseguia pagá-las. Para ajudá-la, seu irmão a apresentou aos literatos da cidade, a quem Anna mostrou suas obras.

 

Seus primeiros poemas começaram a sair na imprensa em 1806.  Em 1809, ela publicou sua primeira antologia poética Neopytnaia muza (Musa inexperiente). A obra obteve ótima recepção do público e foi apresentada à imperatriz Elizavieta Alekseieva que, empolgada, concedeu a Anna uma pensão anual de quatrocentos rublos.

 

A antologia também ganhou a aprovação dos mestres da Literatura russa, incluindo Derjavin, Dmitriev, Krylov, criadores do grupo literário Conferência dos amantes da palavra russa (Беседа любителей русского слова). Em 1811, durante a conferência do grupo literário, Krylov leu em voz alta o poema heroico-cômico Padenie Faetona (A queda de Faetonte), de Anna Bunina, baseado em um dos enredos da obra Metamorfoses, de Ovídio.

 

Esses escritores a nomearam membro honorária do grupo. Infelizmente, isso foi um gesto vazio pois, para a sociedade conservadora da época, uma mulher se apresentar em um palco público, fosse como atriz, cantora de ópera ou mesmo como apresentadora de discursos políticos, tornava-a desprendida moralmente. Ainda mais para uma mulher respeitável e que estava sendo financiada pela família real.

 

Em 1814, reagindo aos terríveis acontecimentos, ela ofereceu ao imperador o hino Pesn Aleksandru Velikomu, pobediteliu Napoleona i vosstanoviteliu tsarstv (Canção ao grandioso Alexandre, vitorioso sobre Napoleão e restaurador de reinos).

 

Estilo das suas obras

 

Denominada por muitos de Safo Russa (em parte em razão de sua paixão pela poesia antiga, cujo estilo Bunina com frequência imitava), a poetisa deixou tantos poemas de meditações filosóficas e hinos em louvor aos "feitos dos maridos" mortos na Batalha de Borodino, quanto poesia lírica pessoal, íntima e carregada de sentimento.





 

Ela se inspirava nos poetas gregos e romanos, principalmente em Safo e Ovídio, escrevendo meditações filosóficas e hinos de louvor aos heróis mortos em campos de batalhas, como o poema em homenagem ao Capitão Rostislav Ivanovitch Zakharov.

 

Ela também escrevia poemas líricos pessoais, íntimos e carregados de sentimento, que levaram seu nome para a posteridade. O poeta e escritor Evgueni Evtushenko (1932 – 2017) dedicou-lhe o poema Anna Primeira (Анна Первая), em que ressalta o pioneirismo da poetisa no front feminino da Literatura russa – mesmo que Anna não tenha sido, de fato, a primeira escritora russa e sim a primeira a fazer sucesso.

 

Anna é reconhecida por ter usado temas e estilos mais diversos e uma faixa métrica mais ampla em suas obras do que as primeiras poetisas russas. Seus poemas incluem observações originais e marcantes sobre as experiências das mulheres, especialmente seus conflitos com os homens.

 

Isso não impediu que elementos proeminentes da sociedade literária russa da época fizessem ataques a ela e a seus escritos, limitando sua influência sobre futuros poetas.

 

Uma orquestrada campanha de difamação

 

O declínio acentuado de Bunina entre a elite literária da época, pode ser atribuído em grande parte a uma maldosa campanha de difamação conduzida por Alexander Pushkin e pela conservadora Sociedade Arzamas. Embora os romances e peças de Pushkin sejam marcos notáveis ​​da Literatura russa, como pessoa, ele foi desprezível ao zombar cruelmente de Bunina em correspondências a amigos.

 

A crítica minuciosa ao conjunto das obras de Bunina, considerada por ele como trivial e muito simples, levou à queda em desgraça da poetisa. O estilo, que ela trabalhara tanto para desenvolver, não estava mais na moda.

 

Previsivelmente, Anna também foi ridicularizada por nunca ter se casado. A dedicação aos estudos havia sido seu grande amor e seu motivo para enfrentar a vida com tanta força. Egoístas e misóginos, esses homens não entendiam – ou não queriam entender – as provações de mulheres que desejavam viver e se realizar como eles.





 

Carreira e Principais Publicações

 

Em 1808, Anna fez uma tradução abreviada de As Regras da poesia de Charles Batteux e uma tradução em versos da primeira parte de Arte Poética de Nicolas Boileau (1808-1809; concluída em 1821). Em 1812, ela publicou o segundo volume da sua antologia poética Neopytnaia muza (Musa inexperiente).

 

Em 1819, ela já tinha estabelecido uma reputação como escritora séria e reverenciada. Com seu charme inteligente, astúcia forte, rimas elegantes e temas feministas, despertou o interesse da culta imperatriz viúva Maria Fedorovna, que providenciou para que Bunina recebesse uma pensão pequena, mas muito necessária.

 

Isso, para Anna, foi uma dádiva de Deus pois a maior parte de sua herança havia sido drenada para pagar os salários de seus tutores e suas próprias despesas. Um estilo de vida quase boêmio na movimentada metrópole de São Petersburgo não saiu barato, mesmo com o orçamento cuidadoso e gostos simples de Bunina.

 

Enquanto isso, Anna se socializava com o fascinante círculo literário do almirante e escritor Alexander Shishkov, seu patrono e apoiador, e o colega poeta Gavrila Derzhavin.

 

Obras literárias

 

Traduções do francês:

Regras da poesia – de Charles Batteux.

Arte poética – de Nicolas Boileau.

 

Poemas e prosa:

Poemas safísticos

Imitação da poetisa de Lesbos

Noites rurais

Canção a Aleksandr

O grande, vitorioso sobre Napoleão e restaurador de reinos

 

Câncer, pensão vitalícia e período de sofrimento

 

Em 1815, ela descobriu que tinha câncer de mama. Os melhores médicos a trataram. O imperador pessoalmente acompanhava o seu estado. Foi decidido que a levariam à Inglaterra, famosa, pela competência dos seus médicos. Infelizmente, os tratamentos experimentais não trouxeram muito alívio. Ela permaneceu na Inglaterra até 1817. Quando voltou à Rússia, concederam-lhe uma pensão vitalícia.




Anna passou os últimos cinco anos de vida entre Moscou e a vila de Riajsk.  Nesse período, até ficar deitada era para ela desconfortável. Por isso, ela passava a maior parte do tempo de joelhos. Diz-se que lia muito a Bíblia em suas últimas semanas. Um de seus últimos poemas, Para os entes queridos (К ближным), fala sobre esse período de sofrimento.

 

Segundo o testemunho dos contemporâneos, suas cartas (que não se conservaram) faziam lembrar as Cartas de um viajante russo de Nikolai Karamzin, pela profundidade e agudeza das observações e pelo tom geral sentimentalista.

 

Anna Petrovna Bunina morreu no final de 1829 e foi enterrada na aldeia de Urusovo, localizada em Ryazan. Um monumento foi erguido sobre o seu túmulo pelo seu afilhado, neto de sua irmã Maria, o viajante Piotr Petrovitch Semiónov-Tian-Shanski e pela sobrinha Nadejda Ivanovna Bunina.



 

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