A Literatura é um espaço masculino?
Uma das
coisas que mais chamava minha atenção nas aulas de Literatura do ensino médio era
nunca ter lido um livro sequer de escritoras
de romance. Tanto dos séculos XVII e XVIII quanto dos séculos XIX e XX. Acredito
que hoje não seja muito diferente.
Será que, intelectualmente, as mulheres seriam inferiores aos homens? Apesar de ainda ter muitas pessoas que acreditam nisso, eu discordo totalmente. O problema está mais no papel social reservado historicamente às mulheres do que na genética. Se você concorda comigo, continue a leitura para entender por que a Literatura foi (e, talvez, ainda continue sendo) durante muito tempo um Clube do Bolinha.
A BBC Brasil publicou a reportagem – As escritoras que tiveram de usar pseudônimos masculinos – e agora serão lidas com seus nomes verdadeiros. Parece até transmissão de pensamento porque eu estava realmente querendo fazer a postagem inaugural deste blog mostrando as dificuldades que várias mulheres enfrentaram nas suas épocas para serem aceitas como escritoras. Veja reportagem completa no Portal da BBC Brasil
Os dois Georges – o britânico e o francês
A escritora britânica Mary Ann Evans adotou o nome George Eliot para ser levada a sério como romancista.
Lançado em 1874, o seu romance Middlemarch:
um estudo da vida provinciana, é considerado uma das melhores obras da
literatura inglesa. A escritora Virginia Woolf chegou a chamá-lo de "um dos poucos livros ingleses feitos
para gente grande".
A pesquisadora Sue Lancer, professora de Inglês,
Literatura Comparada e Estudos sobre Mulheres, Gênero e Sexualidade da
Universidade Brandeis, nos Estados Unidos, conta que um jornal de crítica
literária da época fez duas críticas sobre o livro. A primeira, para George
Eliot, foi elogiosa. A segunda, para Mary Ann Evans, foi bastante negativa.
“A história
ocidental é principalmente de autoridade masculina. Por isso as mulheres
começaram a usar nomes ambíguos ou diretamente masculinos. Elas estavam tentando
se autorizar”.
A escritora francesa Amantine Dupin, uma das autoras mais prolíficas da sua época, era conhecida como George Sand. Ela escrevia contos de amor e de diferenças de classe, criticando as normas sociais. Também escreveu textos políticos e peças, que encenava em um teatro particular.
Amantine causava polêmica em Paris
por usar roupas masculinas, fumar em público e ter casos amorosos frequentes –
coisas proibidas a uma mulher da época.
Sandra Vasconcelos, professora titular de
Literatura Inglesa e Comparada da Universidade de São Paulo (USP) diz que, naquela época, uma mulher que tinha atividade
intelectual estava cometendo uma transgressão enorme.
As que ousavam
publicar usando seus próprios nomes recebiam muitas críticas, porque estavam
extrapolando o papel designado para elas. A maioria usava pseudônimo para não
se expor publicamente.
Escrito por uma dama
Durante os séculos XVIII e XIX, cristalizou-se o papel da mulher como primordialmente mãe e esposa dentro da família burguesa.
A esposa era a responsável pelo mundo doméstico, da porta da casa para dentro. Muitas delas não tinham sequer acesso à educação formal. E toda mulher que tinha algum tipo de ambição para além disso era um ponto fora da curva.
Na capa do
romance Orgulho e Preconceito, primeiro livro da
escritora inglesa Jane Austen, consta apenas: "Um romance. Em
três partes. Escrito por uma dama." Os seus livros seguintes eram creditados
à "mesma autora" dos anteriores.
Publicar
anonimamente ficou menos comum no século XIX. Escrever se tornou profissão e os
romances ficaram mais respeitados como gênero. Isso dificultou ainda
mais para as mulheres assinar livros de ficção.
A sensação de
liberdade também era um fator que levava escritoras a publicar com pseudônimos.
Havia muitas restrições e expectativas sociais em relação às mulheres – sobre a
maneira como elas deveriam escrever e os assuntos sobre os quais elas poderiam
falar.
No Brasil não foi muito diferente
No Brasil, muitas
escritoras também usaram o recurso do pseudônimo ou do livro anônimo pelos
mesmos motivos, segundo a professora de literatura brasileira da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) Constância
Lima Duarte.
O romance Úrsula (1859), considerado por alguns historiadores como o primeiro romance abolicionista da Literatura brasileira, foi escrito por Maria Firmina dos Reis e assinado apenas "uma maranhense".
Em 1887, na Bahia, o livro As Mulheres: Um protesto por uma mãe denuncia o diminuto mercado de trabalho que era reservado às mulheres, a absurda diferença salarial entre homens e mulheres e a valorização excessiva das funções reservadas aos homens. A autora se escondeu tão bem que ninguém descobriu depois quem teria sido essa escritora.
Na próxima postagem você conhecerá o OriginalWriters HP, projeto brasileiro da HP e de uma agência de publicidade, que lançará livros com novas capas, para que os leitores possam conhecer a identidade real de suas autoras. Ou seja, livros que pareciam ter sido escrito por homens, mas que na realidade foram obras de mulheres à frente do seu tempo.
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